A ambiguidade moral em berserk: O egoísmo da ambição versus o egoísmo do afeto

A complexa narrativa de Berserk, obra seminal de Kentaro Miura, frequentemente coloca Griffith sob o microscópio como o arquétipo do vilão narcisista e egoísta. Contudo, uma reavaliação cuidadosa das ações de Guts, o protagonista, sugere uma camada de complexidade moral que o aproxima de seu antagonista de maneiras surpreendentes, focando na natureza do ato egoísta em si, e não apenas na sua motivação.

Muitos apontam para o sacrifício dos membros do Bando do Falcão por Griffith como o auge de sua sede de poder. De fato, o líder escolheu seu sonho acima da vida de seus companheiros, incluindo seu amigo mais próximo. Entretanto, evidências no desenvolvimento de Guts indicam um padrão de priorização extrema que também beira o egocentrismo.

A evolução de Guts e o ponto de inflexão

No início de sua jornada, Guts era retratado como um lutador movido exclusivamente pela sobrevivência e por seus próprios objetivos. A união ao Bando do Falcão representou uma mudança significativa, introduzindo conceitos de lealdade e pertencimento. Essa transformação, no entanto, parece ter se revertido quando sua relação com Casca se aprofundou.

Ao invés de cuidar do grupo que o acolheu, Guts passou a focar quase que inteiramente na proteção de uma única pessoa. O ponto de ruptura dessa dualidade fica cristalino durante o trágico evento do Eclipse. Guts expressou o desejo explícito de fugir levado apenas por Casca, ciente de que tal ato condenaria não apenas o Bando do Falcão, mas também o próprio Griffith à ruína iminente.

Sacrifício por ambição versus sacrifício por amor

A análise sugere que, estruturalmente, o ato de Guts era tão egoísta quanto o de Griffith. O que diferenciava os dois, aparentemente, era o objeto final de seu maior desejo. Griffith almejava seu reino e seu sonho a qualquer custo. Guts, por sua vez, estava disposto a deixar todos perecerem para garantir a segurança e a companhia de Casca.

Em essência, ambos os personagens colocaram uma prioridade absoluta acima da responsabilidade para com o coletivo: Griffith colocou seu destino, e Guts colocou seu amor. O desfecho trágico da amizade e da irmandade entre eles é alcançado precisamente porque ambos os indivíduos, em momentos cruciais, escolheram um único ser ou ideal acima de todos os outros laços criados.

Essa dualidade moral lança luz sobre a crueldade intrínseca ao universo de Berserk, mostrando que o ato de negligenciar o coletivo por um ideal pessoal, seja ele a glória ou o afeto, carrega um peso destrutivo similar. A obra de Miura, acessível em diversas publicações e mídias, permanece um estudo fascinante sobre as escolhas extremas sob pressão. Para mais detalhes sobre a obra, recomenda-se consultar fontes oficiais sobre o mangá Berserk.